Por Daniel Ribeiro.

Ah, nada como ter 18 anos… o vigor, a ingenuidade… e a raiva!

Uns 20 anos antes deles se voltarem contra o Napster, o Metallica era somente mais uma bandinha de Thrash que tentava encontrar seu espaço naquele cenário concorridíssimo em São Francisco, Califórnia. Depois de lançar alguns Eps autofinanciados (e demitir dois membros originais, Dave Mustaine e Ron McGovney), os 4 meninos do Metallica partiram para a sua primeira grande aventura: o lançamento de um álbum completo.

E então, Hetfield e Ulrich, de 18 anos e Hammet e Burton de 19, assinaram contrato com a gravadora independente Megaforce e em poucas semanas estava pronto o seu primeiro disco: Kill ‘Em All, de 1983. De forma lenta, mas constante, o álbum foi conquistando os fãs de Thrash espalhados nos EUA e acabou se tornando o primeiro de vários discos clássicos de uma das maiores bandas do mundo. Quase 35 anos depois, ele ainda mantém sua dignidade e é o favorito de vários fãs (pra mim só perde para o sucessor, Ride The Lightning).

Kill ‘Em All tem 10 músicas, algumas das quais foram retiradas de demos antigas da banda (The Four Horsemen e Hit the Lights), por isso não é surpresa alguma encontrar o Mustaine creditado como co-autor de algumas músicas do disco. O estilo musical é, obviamente, um thrash bem característico com grandes influências de punk/hardcore. Os riffs são rápidos, a bateria é quase toda dominada por pedais duplos e a voz do James está rasgada e agressiva. O que sempre achei interessante, é que mesmo nesse começo, o Metallica já mostrava querer ser uma banda muito maior do que todas as suas contemporâneas, e suas pretensões ficavam bem claras com épicos de 7 minutos como The Four Horsemen ou Anesthesia (Pulling Teeth), que se diferenciam do estilo meio “foda-se o mundo” do resto da obra. Não é que essas músicas sejam lentas, longe disso, mas eu acho que o esforço deles em mostrar algo diferente e incluir outros detalhes dentro dessas músicas fez toda a diferença.

Talvez os melhores momentos da banda nesse disco sejam aqueles em que ela se dedica ao thrash completo, do começo ao fim. Com o som flutuando entre um “death” primitivo e um clássico heavy metal, músicas como Jump in the Fire, Metal Militia ou Seek and Destroy se tornaram hits clássicos e até hoje são aclamadas pelos fãs e pedidas em praticamente todos os shows da banda. Esse belo álbum contribuiu com pelo menos 2 dos riffs mais famosos do Metal: aquela harmonia no começo de Seek and Destroy e o riff de The Four Horsemen. Esses são daqueles que qualquer fã de metal acertaria quando começasse a tocar no Ding Dong do Faustão.

Claro que, para todo lado positivo, sempre existe um negativo, e nesse caso eu acho que é o fato da banda não conseguir manter o mesmo alto nível de qualidade em todas as músicas do Kill ‘Em All. Embora inovadora, Anesthesia às vezes se torna um pouco chata, e dependendo do dia você pode achar que ela é só um solo de baixo complicado e sem sentido do Cliff Burton, com alguma bateria e guitarra lá pelo final. Quanto a Phantom Lord e No Remorse, elas tão ali pra completar o tempo do álbum mesmo, criando um ponto baixo na segunda metade do álbum. Eu tenho uma opinião peculiar desse disco, acho que o todo é pior que a soma das partes. Se você tocar o álbum no aleatório, ou mudar a sequência das músicas ele se torna melhor que se escutar só uma vez do jeito que ele foi lançado. Eu sempre fiz dessa forma e foi assim que me apaixonei pela obra (claro, pulando uma faixa ou outra).

Bom, antes de terminar vou dar uma de Iserhard e falar da produção do disco, que soa, no mínimo, desesperada. O som do baixo e da bateria estão bons, mas parte do trabalho na guitarra se torna extremamente preguiçoso, e a voz tá meio perdida no meio daquilo tudo, dando a impressão de que tá faltando um “punch” da produção. Curiosamente, se a gente ouvir versões remasterizadas e mais modernas não houve muita mudança e melhora no som, e talvez se houvesse isso iria irritar profundamente os fãs do Metallica. Aliás, na opinião de vocês, se esse álbum fosse maravilhosamente bem produzido, vocês não acham que ele perderia a sua melhor característica, que é ser meio cru, honesto, purista mesmo. Talvez né?

Considerando todo o contexto da época, seria injusto julgar esse belíssimo disco pela sua produção ou pelo seu excesso de honestidade. Ele é primitivo, tem falhas, ok,  mas acima de tudo é o som de uma banda crescendo (como banda e como homens) em uma cena musical em formação também. Em 1984, com o Ride the Lightning, já conseguimos perceber uma maior maturidade, a busca de novos elementos, e a raiz de tudo aquilo que semearia a longa e fantástica carreira do Metallica. Esse disco, assim como o Morbid Visions do Sepultura, o Bleach do Nirvana e o primeiro disco do Barão Vermelho com o Cazuza, é mais do que um disco, mas a infâncias dos caras ali, documentada, antes deles se tornarem gigantes e conhecidos em todo o mundo.